Highly recommended

Recomendo a leitura do seguinte post no blog do amigo Jean. Se depois da leitura ainda persistir qualquer dúvida sobre a atual conjuntura da criação poética, sugiro que deixe pra lá, pois não vale a pena esquentar a cabeça com isso. Continue aí a burilar sua lavra sob o feitiço inefável da inspiração e faça de conta que não é com você...

Comentário sobre Robert Frost

Um belo dia um vento frio irá lhe contar algo daquilo que você deixou de lado, amigo. Procure ter calma ao se dar conta de ter decidido seguir por onde a grama parecia menos rala. É razoável pensar que esse caminho talvez seja o menos procurado, afinal quem não quer exclusividade? Mas seriam sinais confiáveis? E se os demais viajantes caminharem descalços?

A uma "poetisa" anônima

Sim, minha querida, para a poesia não deveria haver sexo. Aliás, não há. Mas há gênero, se me permite o trocadilho. Mas quando me referi à poeta do sexo feminino Marianne Moore, minha intenção, ainda que inconsciente, era a de enfatizar o sexo dela. Pois a mim parece um prodígio que ela tenha produzido uma poesia de tamanha qualidade na época em que viveu (entre as décadas de 20 e 60) e com tamanha subversão, talento e wit. Portanto não irei riscar do meu "léxico" uma palavra que, ao meu ver, ainda cumpre uma função que é a de distingüir o sexo de quem produz poesia. Veja bem: quem produz poesia não chega a ser a poesia, poema ou o artefato em si. O artista é só uma ponte.

Quanto a Vinícius de Moraes, não abro mão: foi um "poetinha", com o que há de mais pejorativo no sufixo inho. E com exceção de um soneto ali, uma elegia acolá, me parece um autor menor, revivido hoje às custas de um bairrismo literário (bossa nova pra inglês ver, literalmente) ou, quando muito, às custas de poetisas casadoiras enamoradas. Uma Cecília Meireles de calças...

da série "Ingredientes Ideais"

Sob a luminosidade encantadora de Landkreise, região rural da Bavária, um grupo de fräuleins dirige-se para o campo onde são cultivadas as célebres blueberries. Esses pequenos frutos silvestres, que guardam parentesco com a nossa amora brasileira, são largamente empregados pela culinária ocidental na ornamentação de pratos sofisticados e na confecção de sobremesas.

Com seus rostos angulosos e feições que lembram o ideal grego de beleza apolínea, como se estátuas da Renascença de repente criassem vida, essas jovens emprestam a sutileza de seu toque para apanhar os delicados frutos sem que estes sejam esmagados, o que seria deveras ruinoso para a conservação de seu refinado sabor.

Segundo a tradição local, para a colheita das blueberries são escaladas apenas as mais belas jovens de cada burgo, sendo além disso indispensável que se garanta a castidade de cada uma delas até o momento em questão. Fazendo um paralelo à culinária japonesa, que considera a elevada temperatura corporal das mulheres um obstáculo ao preparo de bons sushis, é sabido que na colheita das blueberries o fato de alguma garota não ser mais virgem pode alterar o sabor do fruto. Do ponto de vista científico, isso se explica através de uma reação química que se dá entre um tipo de ácido contido nas blueberries e hormônios presentes no organismo de mulheres que mantêm relações regularmente ou que possuam filhos.

Os excelentes cestos de madeira trançada, produzidos localmente pelas mãos de experientes artesãs, também são um fator determinante para a calagem do sabor desse fruto, sensível à luz, poeira, umidade, intensidade do vento e outros fatores conhecidos apenas pelos produtores rurais landkreiseanos.

No mercado gastronômico negro francês podem ser obtidas pequenas porções desse fruto, cujo contrabando vem sendo implacavelmente combatido pelas autoridades mundiais, que alegam não serem salubres nem éticas as condições de plantio das blueberries. Isso ocorre devido ao número cada vez mais escasso de voluntárias para a colheita, o que força os produtores a manterem campos de concentração ilegais cravados nos ermos vales dos alpes landkreiseanos, onde inúmeras jovens são mantidas cativas e impedidas de manterem relações ou engravidarem.

Ao lado de ativistas que combatem o consumo de fois-gras já estão algumas organizações não-governamentais empenhadas em banir esse exótico elemento da high cuisine mundial. No entanto, blueberries sem atestado de procedência e que não contemplem as condições ideais de produção dificilmente alcançam um bom preço no mercado. Além disso, experts e renomados chefs de cozinha não garantem a qualidade de pratos preparados sem os frutos ideais.

Fisiologia do (fazer) gênero

Apenas quando não me detenho na palavra poesia ou literatura é que sou capaz de engendrar imagens mais realistas, chamativas e, pra dizer o mínimo, dignas de serem vistas. Pensar a priori num soneto ou numa forma alternada de rimas é o que eu chamo de pretensão inútil, pois se sabe que não vai dar em nada, ou melhor, no máximo uma frase de efeito ou outra forma cultivada.

Há os "poetas" que inclusive não se acanham de atribuir essa alcunha ao próprio ofício, os poetas que estão de fato preocupados se aquilo que pariram vai se chamar soneto, conto, romance ou descarado modernismo. Um ofício que às vezes beira o sindicalismo (como se os poetas devessem reivindicar décimo-terceiro, férias e aposentadoria por invalidez.) E à distância imensurável entre o início e o fim da obra, dão o nome de inspiração (ou seja lá que outra abominável metáfora.)