O blues curtido de Odetta

Ouvir o blues ancestral & primitivo de Odetta é uma experiência espiritual. Em incursões breves, com canções de 2 a 3 minutos, ela canta passagens bíblicas e lamentações com uma fé e perseverança que já prenunciavam o funk e o soul anos depois. Esta blueswoman de timbre grave e ritmo forte logra ter inspirado gente como Bob Dylan e Janis Joplin. No álbum Odetta Sings Ballads and Blues, a impressão que se tem é a do mais depurado espírito protestante norte-americano, uma voz que parece vir dos recôncavos da alma, com um timbre naturalmente granulado e gutural. Ouça a faixa Joshua aqui.

Progressive Zombie

Como o próprio título sugere, a trilha sonora do filme Zombie Holocaust é um bomba. Mas no bom sentido. O compositor italiano Nico Fidenco assina uma trilha puramente sensorial, pulsante e claustrofóbica, com toques de jazz, funk, jungle e batidas obstinadas que muitas vezes lembram o techno. Obra exploitation da mais suprema tosqueira e oportunismo, tem a manha de combinar dois outros sub-subgêneros aparentemente inconciliáveis numa só história: canibais & mortos-vivos. Para fazer download da faixa 8, clique aqui.

Battle Royale ou "gincana sádica"

Chega em DVD ao Brasil com sete anos de atraso mais um filme ultra-violento vindo do Oriente: Battle Royale (Batoru rowaiaru, 2000), dirigido pelo japonês Kinji Fukasaku, conta a história de um grupo de estudantes que, num Japão totalitário e dominado por "adultos", é raptado para uma ilha deserta afim de participarem de um grotesco reality-show do qual somente um sairá vivo. Até aí é perigoso pensar que se trate de um filme à la Jogos Mortais, com sua estética de parque de diversões. Longe disso, Battle Royale é uma mistura bem-sucedida de diversos gêneros tais como o mangá, paixões estudantis, uniformes à moda RBD, tiros, sangue, vísceras, gritos histéricos e tramas rocambolescas. Enfim, uma combinação de ingredientes inusitada que, no final das contas, acaba dando certo nas mãos de um diretor frenético como Fukasaku.

E à frente da sádica empreitada, feito um Big Brother sanguinário, o ator Takeshi Kitano (de Zatoichi) interpreta um professor outrora ridicularizado pelos alunos, que nos faz lembrar de alguns ditadores que o Oriente já abrigou. As regras do jogo são bem simples: presos numa ilha e controlados por uma coleira magnética (que os degola caso ultrapassem os limites da praia), os estudantes são forçados a se matarem uns aos outros para saírem ilesos do jogo. Em muitos momentos o filme nos lembra o seriado Lost, que se vale de flashbacks a todo instante para nos remeter à vida anterior de seus protagonistas e explicar suas motivações. Garotas de saia colegial e meias brancas*, bem ao gosto perverso japonês, e rapazes uniformizados são abruptamente levados a se matarem com requintes de crueldade, seja com metralhadoras, machados, facas ou revólveres, como se de repente um Robert Rodriguez passasse a dirigir o seriado Malhação da Rede Globo. E a cada morte, as baixas são mostradas sob a forma de estatísticas na tela, como se num videogame ou intervalo de jogo de futebol.

BR acaba sendo uma leitura muito peculiar feita pelo Japão do fenônemo rebelde, minissaias & gravatas. Quem não se lembra daqueles programas de disputas entre colégios? Só que desta vez com metralhadoras e facas.