O hieratismo indecifrável de Charles Mingus

Na corda bamba do blues Charles Mingus foi para o jazz o maior exemplo de modernidade compromissada com a causa dos antigos (a.k.a. roots ou raízes). Acima de tudo ele foi um mestre contrapontista, romântico e expressionista de uma maneira absolutamente diferente de seus contemporâneos do free-jazz. Aliás, Mingus ainda não está totalmente "free" pois sua dignidade e sensação de gratidão para com o passado impedem sua música de soar como outra coisa que não seja o blues.

Alguns adjetivos para a obra desse homem, sob o risco de obscurecê-la, poderiam bem indicar o atalho de sua poética profunda, extravagante, opulenta porém glamourosa, epifânica, solene, dramática... Dizem os jazzófilos que, ao morrer no México em 1979, centenas de baleias morreram encalhadas nas praias daquele país. E o fato de ter sido arranjador, compositor, intérprete e band-leader só me fazem pensar no quão hierático foi o recorte dessa figura (de boina e suspensórios), um homem de temperamento tão corpulento como seu próprio contra-baixo atrás do qual ele exortava os companheiros segundo seu humor (mood) não raro aguerrido, durante a batalha, como se tangesse as cordas de uma lira mais robusta e mais pesada.

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